domingo, 31 de março de 2013

INVASÃO HOLANDESA







OS DISSABORES DA INVASÃO HOLANDESA À CIDADE DE

 SÃO CRISTOVÃO (1637-1645)

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Resumo: Em 1637, quando a cidade de São Cristovão ainda engatinhava no desenvolvimento da sua  capitania, irrompe a invasão holandesa trazendo sérias consequências e provocando vários conflitos durante os sete anos de sua ocupação, tanto no que diz respeito a interrupção no processo de colonização, quanto na vida administrativa, na estagnação das atividades de subsistência, bem como, na produção dos recursos,  somado ao atraso que se processou nesse período. Nesse sentido, esse texto tem como o objetivo entender como se deu esse processo de embates entre holandeses e portugueses nessa cidade. Para tanto, nortiei-me principalmente nas referências de Thétis Nunes e Felisbelo Freire, que abordam muito bem o tema em questão.

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Palavras-chave: São Cristovão, Invasão, Embates, Destruição.



A vetusta cidade de São Cristovão foi a primitiva capital do Estado de Sergipe, e desde do processo de fundação, foi palco de grandes embates e lutas no campo político, administrativo e social ao longo dos séculos, onde por mais de uma vez, foi invadida por desordeiros e revoltosos. Nesse nosso estudo, cabe trabalhar apenas o período da invasão holandesa à essa cidade, compreendido entre 1637-1645. O prelúdio desses enfrentamentos se dá, com o grande embate no alvorecer de 1590, com a consolidação da vitória de Cristóvão de Barros, que tendo vindo realizar pelas armas, a conquista do território sergipano que se achava sob o domínio do gentio, aliado à piratas franceses que chegaram pelos fins de 1589, deixam cerca de 2.400 índios mortos e 4000 feitos prisioneiros.
O conquistador após cuidar dos feridos, fundou a cidade-forte de São Cristovão próximo à foz do Rio Sergipe, também conhecido como Rio cotinguiba, no ístmo formado pelo Rio Poxim. Essa povoação, já citada acima, à qual Cristovão de Barros assim denominou-a, em honra ao santo do seu nome, era também chamada de Sergipe Del Rei, por ser a conquista em parte resultado de iniciativa real, e também para diferenciá-la de Sergipe do conde, território pertencente ao recôncavo baiano, essa seria a nascente capital, da neófita capitania de Sergipe.

Naquele momento a incipiente São Cristovão, passou os seus primeiros anos de vida, sem maiores transtornos na sua história, lançado os fundamentos da vida administrativa no rumo de sua colonização. É a partir de lá, que começaram a expedir-se pelos seus capitães-mores, as primeiras cartas de sesmarias visando povoar-se o território, num impulso  de penetração que ia do sul e, depois, do leste, para o oeste. Grande foi a corrida inicial de colonos pela posse da terra sergipana. Duas décadas após a vitória de Cristovão de Barros sobre os gentios, já se apresentava promissora a vida nessa capitania.
Esse processo de desenvolvimento fora interrompido em 1637, quando irrompe a invasão holandesa em Sergipe, e São Cristovão como sede da Capitania, sofre mais um trágico infortúnio resultante do enfrentamento de fogo. De acordo com o autor, Felisbello Freire, na obra “História de Sergipe” o conde Bagnuolo era o comandante das tropas portuguesas, e estava fortificado em Porto Calvo, quando Maurício de Nassau, assumindo a direção do governo holandês em Pernambuco, logo pôs-se a campo com as tropas holandesas  a estender os domínios para o sul, tomando conhecimento do avanço da força holandesa, e por não poder deter o exército inimigo, Bagnuolo abandona Pôrto Calvo, e batendo em retirada chega ao Rio São Francisco em 27 de março de 1637, edificando um forte que denominou de Mauritius.
No mesmo ano, Bagnuolo após obter a notícia de que, o exército holandês reunia forças para continuar o avanço em direção ao São Francisco, e tendo conhecimento da superioridade numérica do seu opositor, objetivando uma ação definitiva, novamente temendo o embate e visando proteger o coração da colônia, o exército luso-brasileiro do Conde Bagnuolo, recua agora em direção à São Cristovão, chegando à cidade em 30 de março, não tardando encetar contra o inimigo que se aproxima, uma guerra de emboscadas.
No dia 14 do mesmo mês, mais uma vez sentido a desvantagem de um combate frente à frente, abandona a cidade fugindo para a Bahia, porém, antes expede diversas partidas a devastarem e assolarem a fogo o território que abandonavam, causando devastações pelas ruas e os arredores, a fim de que, as forças inimigas não encontrassem muito o que aproveitar.
Quando as tropas de Maurício de Nassau penetram os muros de São Cristovão, em 17 de novembro de 1637, já encontram a cidade indefesa e novamente a incendeiam e a destroem. Nesse período, a São Cristovão já possuía cem fogos (casas), uma misericórdia e dois conventos. A despeito dessa destruição diz FREIRE: “A destruição encetada pelos conquistados é acabada pelos conquistadores, que entregam às chamas a pequena cidade devastam os canaviais e os sítios, incendeiam os engenhos e em vez de proteger os infelizes abandonados, aqueles cujas forças privaram de acompanhar os seus concidadãos, enxotam-nos de seus lares, para com a miséria e a dor, seguirem a reforçar o exército fugitivo”. (FREIRE, Pg, 126).
De acordo as “efemérides sergipanas”, depois que os invasores devastaram toda a capitania, retiraram-se para o São Francisco, sem nela deixar o menor vestígio de administração pública, não obstante incorporada ao seu domínio. Para Felisbelo Freire, essa atitude demonstra que os holandeses trataram Sergipe com desdém e esse teria sido o gérmen  da queda  do seu domínio no Brasil.
As consequências dessa invasão foram várias, desde os saques e devastações realizadas pelos conquistadores e fugitivos na região, fazendo da capitania um deserto, exaurindo com o trabalho agrícola, interrompendo o contínuo processo de colonização a partir da cidade de São Cristovão,  até provocar o atraso na vida administrativa local.
A pecuária que havia se tornado inicialmente, a mais importante atividade  dos colonos desde os primeiros anos da conquista em 1590, vai sofrer grandes baixas, encerrando-se a primeira etapa do desenvolvimento dessa atividade na capitania de Sergipe. Não só a criação do gado, más as culturas de subsistência que até então, tinham sido  o suporte da economia sergipana, além do fumo que estava em desenvolvimento, como bem observa a  autora Thétis Nunes, que diz: “quando os holandeses aqui chegaram, no começo do século XVII, encontraram muitas lavouras dos melhores tabacos.”
A despeito do estagnamento dessa atividade pastoril na região, diz NUNES: “A destruição do gado existente foi feita por ambos os contendores. Bagnuolo levou para a Bahia cerca de 8.000 reses, após ter matado 5.000, os holandeses fizeram passar para seus domínios de além São Francisco, todo o gado que foi possível, sacrificando 3.000 cabeças que não puderam levar”. (NUNES, pg, 102).
Antes da devastação autorizada pelo conde Bagnuolo na cidade de São Cristovão, os recursos da região eram consideráveis. No que diz respeito a criação de gado, desde o período da consolidação do domínio luso, as exportações da Capitania de Sergipe del Rei eram o gado vacum e cavalar, as criações miúdas, que compreende porcos, ovelhas, cabras, e os derivados das culturas de subsistência, em que se destacavam a farinha de mandioca, o arroz, o milho, e o feijão. (NUNES, pg. 144).
Corroborando com o pensamento de Thetis Nunes, de que a capitania de Sergipe apresentava-se promissora, o autor Felisbelo Freire em um contexto que trata da devastação causada a capitania diz: “Bagnuolo, em uma incandescência de ódio e rancor, no intuito do inimigo nada encontrar na nascente capitania, entrega tudo à destruição de seus soldados, desaparecendo uma pequena riqueza, acumulada em quarenta e sete anos de colonização” (FREIRE, pg. 126).
A farinha de mandioca, produto de subsistência muito cultivado na capitania sergipana, foi de grande importância na alimentação dos holandeses, tanto que a partir de 1640, o príncipe Nassau baixou uma resolução, obrigando os senhores de engenho e os lavradores de cana a plantarem, para cada negro escravo, 300 covas de mandioca; os que não tivessem engenho ou não plantassem cana deveriam plantar 500 covas.
Em 1640, torna-se a cidade em novo palco de lutas entre forças portuguesas e os holandeses, desencadeando a batalha em 1º de agosto, da qual as tropas portuguesas saíram vitoriosas, marcando uma etapa decisiva no que poderia ser uma retomada de Sergipe para o domínio de Portugal.
Em 1641, o príncipe de Nassau mandou que Andreas, um dos comandantes holandeses das tropas do São Francisco, com reforço de quatro barcos que lhe foram enviados de Recife, invadisse o território sergipano até atingir o Rio Real, onde deveria ser construindo o trincheiramento, no entanto, numa atitude estratégica o comandante holandês penetrando pela barra do Vazabarris, arvora a bandeira de paz e sendo recebido sem hostilidade desembarca e apodera-se de surpresa da cidade.
Não satisfeito com esse desfecho, Felipe Camarão numa tentativa de recuperar o território, cerca São Cristovão por algum tempo, tentando retomá-la de Andreas, más, sem sucesso, faltando recursos levanta o cerco. Essa tentativa de recuperação será suplantada por algum tempo, principalmente em 1642, quando a capitania de Sergipe é doada oficialmente pelo Supremo Conselho da Administração dos Estados Gerais das Províncias Unidas Neerlandesas no Brasil, a Nunin Olfers, ficando assim, São Cristovão em poder dos holandeses.
Por fim, o ano de 1645 significa definitivamente o último dos embates entre os beligerantes, quando após o enfrentamento que culminou com a derrota do forte exército de Nassau, pelas tropas luso-sergipanas, e corolário desse processo é a queda do reduto dos holandeses na cidade de São Cristovão, ante o cerco de D. João de Souza, sendo feito prisioneiro na cidade o comandante holandês, Van Vagels. A partir desse momento, ocorre a segunda fase de desenvolvimento da economia sergipana, na medida que uma vez  expulsos os holandeses para sempre da capitania, volta à mesma, a desempenhar seu papel de capital nas providências de natureza político-administrativas, para a recuperação do território sergipano devastado e restauração da ordem.
 
No bojo da reconstrução da vida econômica sergipana, após o período turbulento da última metade do século XVII, ao qual Cândido Mendes chama de “período de obscurantismo”, referindo-se ao período de ocupação holandesa, cresceram as culturas de subsistência. A recuperação da capitania foi compartilhada e motivada por um espírito de coletividade entre a sociedade pastoril, que já havia sofrido vários golpes, e apesar de muitas vezes entrar em divergências, em outros momentos da vida local, agora unia suas forças nesse momento importante para  a retomada da economia da capitania.







REFERÊNCIAS

DÓRIA, Epifânio. Efemérides Sergipanas – volume I: Organização de Ana Maria Fonseca Medina. Aracaju: Gráfica  Editora J. Andrade Ltda., 2009.
Enciclopédia dos Municípios brasileiros. XIX volume. Rio de Janeiro 1959.
FREIRE, Felisbelo. História de Sergipe. 2 ed., Petrópolis: Vozes/ Aracaju:
Governo do Estado de Sergipe, 1977.
NUNES, Maria Thetis. Sergipe Colonial I. Rio de janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.
SOUSA, Antonio Lindvaldo. Das Insubordinações e Protestos à Independência da capitania de Sergipe. In: Temas e História de Sergipe II. São Cristovão: Universidade Federal de Sergipe/CESAD, 2007.